Rubens Leite, advogado e sócio-gestor da RGL Advogados
Programas de conformidade devem ganhar ainda mais espaço após a crise, diante da necessidade crescente de mecanismos de cumprimento, monitoramento e controle
Muitas empresas estão com dificuldade para lidarem com a implementação de home office exigida pela pandemia do novo coronavírus. A falta de programas de compliance e de sistemas de cibersegurança tornaram o cenário ainda mais alarmante.
De acordo com o advogado Rubens Leite, sócio-gestor da RGL Advogados, o compliance se fortaleceu no Brasil com a Lei Anticorrupção Brasileira 12.846/2013, no sentido de criar procedimentos dentro das empresas, com foco de prevenir a corrupção e criar mecanismos internos de monitoramento e controle.
Por consequência, esses programas tomaram corpo e hoje se fala em compliance de forma ampla, tendo vertentes como o compliance de consumidor, o compliance trabalhista e, o mais recente, compliance de proteção de dados.
“A implementação desse programa é essencial para que as empresas passem a criar ferramentas e mecanismos de gestão e de controle a fim de evitar problemas de diversas ordens. Nesse momento em que as empresas foram impactadas e sofreram uma ruptura brusca dentro da sua rotina, seja por mudar a dinâmica interna, ou pelo próprio home office, temos uma importância grande do programa de compliance, porque ele deve olhar para essas mudanças e adaptar toda essa conformidade com as normas internas e externas, como a legislação por exemplo”, explica o especialista.
Ainda de acordo com ele, a tendência é que o compliance ganhe ainda mais espaço após a pandemia, já que as empresas estão enxergando cada vez mais a necessidade de se ter mecanismos de cumprimento, monitoramento e controle, a fim de garantir a segurança de todos os colaboradores.
“O funcionário também ganha com o compliance na medida em que tem a segurança do processo em que ele está como parte envolvida e também vai ter o seu resultado mais garantido. Então esse monitoramento e controle de forma remota, que agora se impõe nas empresas, é essencial e acredito que veio para ficar”, revela Rubens Leite.
Abaixo, o especialista aponta cinco momentos em que o compliance ajuda a lidar com os desafios da pandemia. Confira:
o Facilita a adaptação do home office – O maior desafio que as empresas estão enfrentando é a ruptura com o procedimento natural. “Algumas companhias já possuíam processos escritos e tiveram que adaptá-los ao home office de forma bem ágil para que não houvesse espaço para rupturas. As empresas que não tinham programas de compliance e que tinham a sensação de que não era necessário implementar mecanismos de monitoramento e controle, exigência de cumprimento de normas externas e internas, acabaram por enxergar a essencialidade de se ter políticas de conformidade, o que vai trazer, por exemplo, um código de ética e conduta, um regimento interno, um canal de denúncia e até implantar ferramentas de comunicação mais efetivas. Essas normas internas vão dispor sobre o comportamento dos colaboradores em relação à organização e trarão a adaptação dessas normas ao home office, podendo ser totalmente prevista dentro deste cenário. A partir disso, é possível garantir a transparência, evitar desvios e alcançar a segurança da informação, bem como os controles de produtividade e desempenho das empresas”, comenta o advogado.
o Monitoramento e controle mesmo em home office – Muitos procedimentos internos que antes eram desenhados com base na realidade física dentro das empresas agora acabam sofrendo alterações, já que surgem novas realidades em razão do home office. “Muda-se muita coisa quando se trabalha remotamente, portanto é preciso que se revisem esses processos internos, a ponto de garantir a estabilidade do controle e do monitoramento dos atos internos da organização, durante o trabalho remoto”, assinala o advogado.
o Processos internos organizados – Quando se cria um programa de compliance sólido, é possível ter todos os processos internos da organização claros e descritos com transparência, pontos de checagem e rastreabilidade, seja ele focado na proteção de desvios de conduta, até na relação com o consumidor, colaboradores e terceiros. “Com procedimentos internos claros e objetivos, você consegue monitorar muito melhor a atuação de todas as áreas da organização. Por exemplo, no caso do compliance na área financeira, há uma redução do prejuízo muito grande, porque com todos esses mecanismos de controle evitam-se inconsistências financeiras, seja por ato intencional ou não. De outro lado, por exemplo, o compliance ligado ao consumidor deve ser levando em conta e, eventualmente, revisto justamente pela transformação digital que a pandemia trouxe, gerando muitas mudanças nas políticas de vendas e de pós-vendas, que devem estar de acordo com a lei. Por fim, o compliance trabalhista é igualmente essencial, porque houve uma alteração muito grande na prestação de serviços dos colaboradores. Essas mudanças devem ser analisadas e se implantar ferramentas de proteção, como aditivos contratuais, monitoramento de satisfação e de infraestrutura para o desempenho do trabalho”, diz Rubens Leite.
o Proteção de dados aliada ao home office – “O compliance de proteção de dados é também uma modalidade fundamental durante o trabalho remoto. Isso porque, dentro das dependências físicas da organização, existe um sistema fechado, normalmente tem uma rede e monitoramento de diversas frentes. Agora muitas empresas em home office estão trabalhando com os dados de clientes, de fornecedores e de funcionários, que tinham acesso anteriormente, mas agora acessam de casa. Isso faz com que haja uma preocupação com violações ao tratamento de dados, como o vazamento ou algum uso alheio àquele inicialmente proposto, seja intencional ou também não intencional, porque quase todos os colaboradores estão utilizando sinais de Internet pessoais, sistemas ou computadores que possam oferecer algum risco. Então esse ponto do compliance de proteção de dados é fundamental e precisa ser analisado também”, alerta o especialista.
o Adote um sistema de compliance – Uma das formas de implementar o sistema de compliance é por meio da contratação de uma consultoria especializada para que ela possa realizar um diagnóstico interno, uma análise de risco das informações ali prestadas e possa também garantir que se construa uma série de regramentos que vão permitir, por exemplo, que haja um código de conduta, políticas essenciais, canais de denúncias, de comunicação, etc. “As empresas que possuem um sistema de compliance sólido acabam por garantir monitoramento e controle sobre os processos internos, gerando segurança e estabilidade, bem como, de forma mais macro, a valorização da marca, demonstrando transparência e credibilidade para o mercado externo. Então esses são alguns dos principais benefícios que o programa de compliance traz”, finaliza Rubens Leite.