Antes da contratação, a empresa do influenciador e ele próprio devem passar por uma due diligence, com uma análise detalhada do seu histórico, avaliando-se o seu comportamento, valores e possíveis controvérsias anteriores
Patricia Punder (*)
Em 2024, acompanhamos muitos casos envolvendo influenciadores digitais. Assistimos a situações de prisões, divulgação de jogos online proibidos, fraudes em sorteios e até lavagem de dinheiro. Claro que não podemos generalizar e afirmar que todos os influenciadores digitais atuam de forma antiética e/ou ilegal. Todavia, podemos afirmar que muitas empresas que contrataram os influenciadores digitais que passaram pelas situações acima mencionadas sofreram abalo em sua reputação.
Quando uma empresa vincula a sua própria imagem ou de seu produto a um influenciador digital, significa que ele/ela utiliza de seu poder de influência para divulgar a imagem ou o produto. Tudo o que acontecer negativamente na vida do influenciador digital automaticamente será vinculado à imagem ou produto de uma empresa.
Afinal, o papel do influenciador digital é divulgar marcas e produtos para seu público próprio, indicando que os utilizam em seu dia a dia. Que os mesmos fazem parte de sua primeira e única escolha em sua própria vida cotidiana.
É por este motivo que as empresas buscam influenciadores que tenham o maior número de seguidores. Se a bolha de seguidores comprarem a ideia desta vinculação entre marca ou produto com a vida do influenciador, tais seguidores irão comprar os produtos e também indicar em suas próprias comunidades profissionais e pessoais. Aumentando assim ainda mais a visibilidade da marca ou do produto e gerando a conversão de vendas, que desde o início é o objetivo da empresa contratante do influenciador.
Valores sinérgicos
Teoricamente, as empresas deveriam contratar influenciadores digitais que possuem valores sinérgicos aos da própria empresa, até para não soar falsa a divulgação. Entretanto, não tem sido isso o que acontece. O influenciador que estiver em cima da onda em determinado momento é o escolhido pelo departamento de marketing da empresa ou pela agência de publicidade para a divulgação.
Claro que já existem empresas que atuam com segmentação da divulgação de sua marca e produtos, atuam de forma estratégica, mas não é o que de fato acontece na maioria dos casos.
Podemos fazer um paralelo com uma série brasileira onde temos a vilã promovendo nas redes sociais a Lolaland. Na série, o que vale é a aparência, likes, vendas e dinheiro. Não existe a menor preocupação em relação aos consumidores e ao público em geral. Significa o vale-tudo nas redes sociais.
Importante relembrar que influência se refere ao processo pelo qual uma pessoa ou coisa exerce efeito sobre a opinião, comportamento ou sobre os valores pessoais dos cidadãos. Isso pode ocorrer de diversas maneiras, incluindo persuasão, por exemplo, autoridade ou pressão social.
A influência é uma força dinâmica presente em várias esferas da vida, desde interações cotidianas até contextos mais amplos, como mídia, política e cultura. A responsabilidade do influenciador digital vai além do simples entretenimento: ele molda percepções, influencia decisões e pode causar impactos reais na vida dos seguidores como um todo.
As crises reputacionais decorrentes da contratação de influenciadores digitais podem impactar diretamente as empresas em diversas frentes. Associar-se a influenciadores sem alinhamento estratégico pode resultar em perda de credibilidade, afastamento dos consumidores, boicotes e desvalorização da marca ou do produto. Ademais, polêmicas associadas aos influenciadores podem viralizar (e de fato viralizam), exigindo respostas rápidas para conter o dano.
Devido ao exposto acima, recomendamos que sejam tomadas algumas providências dentro das empresas antes da contratação dos influenciadores digitais. Uma vez que a prevenção sempre sai mais barato do que a remediação.
Compliance nas contratações
O processo de compliance aplicado às contratações é sempre efetivo. O departamento de marketing ou o próprio corpo diretivo não deveriam seguir adiante na contratação do influenciador, mesmo que seja urgente por ser um hit do momento, sem que antes a empresa do influenciador e ele próprio passem por uma due diligence (análise reputacional) que pode ser executada internamente pelo próprio setor de Compliance da empresa ou por escritórios de advocacia que atuam fortemente nesses serviços. O objetivo é essencialmente realizar uma análise detalhada do histórico do influenciador, avaliando o seu comportamento, valores e possíveis controvérsias anteriores.
Ademais, recomendamos ainda a inclusão do jurídico na elaboração do contrato de prestação de serviços. Existe uma série de pontos aplicados nesta contratação que devem ser considerados pelo jurídico e pela empresa contratante com o fim de prevenir riscos. Um contrato bem elaborado pode inclusive conter obrigações a serem cumpridas pelo influenciador em caso de uma eventual crise.
O último ponto seria o monitoramento contínuo do influenciador durante e após um período ao final da contratação. Em caso de crises, é vital que a empresa e o influenciador ou o gestor da companhia mantenham uma comunicação ágil e transparente, demonstrando compromisso com a ética e a responsabilidade.
Conclusão: as empresas devem ter ainda mais cautela na contratação de influenciadores digitais. Entendo que a maioria das empresas não querem, de jeito nenhum, deixar de aproveitar um excelente momento de um influenciador que esteja em alta no mercado. Afinal, as empresas querem vender e ter lucro. E as mídias sociais permitem a conversão de influência em compras. Cada like vale muito. Contudo, os riscos reputacionais existem e não podem ser menosprezados. O lucro deste mês pode ser o prejuízo do próximo.
(*) Advogada e CEO da Punder Advogados. Professora de Compliance no pós-MBA da USFSCAR e LEC – Legal Ethics and Compliance (SP).