Projetos com soluções de gestão jurídica têm caráter estratégico e exigem um planejamento cuidadoso

Ao adotar novos sistemas, a maioria dos escritórios age mecanicamente, seguindo a manada e escolhendo os produtos da moda

Alexandre Dinamarco (*) 

Ao querermos abraçar o mundo, esquecemos do básico?

Discute-se cada vez mais a influência da tecnologia no mercado jurídico, e não há dúvidas de que inovações nesta área, como Inteligência Artificial (IA), Mobilidade e Conectividade, precisam figurar nas estratégias de sociedades de advogados que têm a ambição de crescer e se estabelecer em um mercado cada vez mais competitivo.

No entanto, o profissional de Direito, que apenas recentemente tem assumido seu papel de empresário, além do de advogado, não deve esquecer que há uma questão mais básica a ser resolvida: o uso de ferramentas adequadas para maximizar a eficiência da gestão do escritório.

Observa-se que “a ficha caiu”, e os sócios e sócias da advocacia estão sem dúvida investindo mais na modernização de sistemas financeiros, de gestão de processos ou de arquivamento. Mas ainda há muito chão a percorrer, e a percepção é de que a maioria dos escritórios adotando novos sistemas o fazem mecanicamente, seguindo a manada e escolhendo os produtos da moda.

Portanto, o profissional de Direito que agregar o valor da inovação tecnológica às suas práticas terá uma grande vantagem competitiva, não apenas antecipando-se no que diz respeito às sofisticações representadas por novas áreas como IA, mas sobretudo ao se desgarrar da manada e entender e investir nas soluções tecnológicas apropriadas para a sua sociedade, que otimizem a gestão diária, ofereçam mais qualidade na prestação de serviços a clientes e apontem caminhos para a expansão do escritório – objetivos imediatos de qualquer organização.

Mas quais são os critérios que identificam as ferramentas adequadas?

O sistema corporativo é um facilitador das estratégias, práticas e processos que já existem no escritório, e a solução tecnológica completa é muito mais do que apenas a marca do software que está sendo adquirido. Ela será, na realidade, a resultante de um projeto que tem que ser tratado como uma das iniciativas mais importantes da história de qualquer sociedade até aquele momento.

No entanto, ao tomarem a decisão de investir em um determinado sistema, muitos sócios acham que terminou ali sua responsabilidade – já escolheram o produto e aprovaram o orçamento, basta delegar à área de TI a missão de instalar e rodar. Esse é o primeiro erro a ser evitado – nem todos os sócios precisam participar ativamente do projeto, mas uma escolha dificilmente será bem sucedida se não houver alinhamento de todos nas seguintes questões antes mesmo de um produto ser selecionado:

  • Entender a estratégia de longo prazo da sociedade e validar, da forma mais específica possível, a iniciativa da implementação como suporte a esta visão;
  • Preparação para discutir e incorporar as mudanças a serem proporcionadas pela implementação;
  • Dar respaldo à equipe de implantação, delegando a ela autoridade para conduzir o projeto e propor e promover mudanças;
  • Estabelecer as metas realistas que definem, caso sejam atingidas, que o projeto foi bem sucedido.

O resultado deste alinhamento será a formulação de diretrizes para a condução operacional do projeto. Os passos seguintes são:

1.A sociedade definir o sócio patrocinador (que personifica o respaldo dos demais) e lideranças funcionais do projeto. Esta equipe, uma vez formada, conduzirá os demais passos;

2.Identificar todos os processos internos que deverão ser suportados, alterados e melhorados por uma nova ferramenta;

3.Pré-selecionar todas as soluções no mercado que atendam a estes processos, e iniciar um processo cuidadoso de due dilligence, através de discussões com os profissionais de cada fornecedor, identificando qual oferece o produto que melhor se adapte às ambições da sociedade (sempre tendo em mente as diretrizes resultantes do alinhamento estratégico).

Muitas vezes as funcionalidades apresentadas por cada solução serão semelhantes, portanto é essencial ser minucioso na análise, mas também ser flexível para aceitar sugestões que possam representar mudanças em certos processos. O produto escolhido deve, é claro, apresentar a melhor solução tecnológica, mas igualmente importante é avaliar a capacidade do fornecedor em suportar as mudanças e oferecer profissionais capacitados para conduzir o projeto.

Também não se deve esquecer dos pré-requisitos – a estrutura de TI do escritório está preparada para a implementação dos produtos apresentados? As diferentes soluções podem requerer especificações que exigirão em maior ou menor grau investimentos adicionais da sociedade em hardware ou licenças de softwares de suporte, que devem, portanto, fazer parte do business case – lembrando que podem incorporar mais tempo à cronologia do projeto.

4.Recomendar a solução para a sociedade, com uma ou duas alternativas, explicando os critérios (novamente, tendo em mente as diretrizes iniciais) que a qualificam como melhor opção.

É fundamental que a sociedade, uma vez recebendo a recomendação, dê a aprovação final para a escolha relembrando a visão inicialmente estabelecida, e renove o alinhamento e respaldo para a fase de implementação.

E o que devemos saber antes de começar a implementar?

Como qualquer projeto bem sucedido, a implementação deve observar as melhores práticas de Gestão de Projetos.

Destacam-se, no entanto, os seguintes cuidados em projetos de tecnologia para o setor jurídico:

  • Comunicação frequente com a sociedade – todas as correções de rumo, naturais em longos projetos, têm que ser informadas e validadas;
  • Participação intensa de profissionais do escritório – a entrega da solução tecnológica não é apenas um serviço prestado pelo fornecedor do sistema, mas um processo que exige dedicação das equipes de área administrativa (Financeiro, TI, RH, etc) em todas as etapas;
  • Fluxo constante de informações com o fornecedor – os projetos de tecnologia podem ter premissas interpretadas de forma diferente pelos implementadores. Portanto, é fundamental buscar sempre a clareza dos próximos passos, reavaliar riscos e comunicar o que já foi realizado;
  • Clareza na comunicação de eventos que afetam usuários – é essencial para o sucesso da tecnologia que os profissionais afetados, que serão os usuários do sistema, saibam com antecedência quando suas rotinas serão alteradas, e as razões e benefícios destas alterações.

(*) Gerente de Serviços Profissionais da Aderant para Europa, Oriente Médio e África

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