Uma análise de como a Autoridade Nacional de Dados irá atuar após a entrada em vigor do trecho da LGPD que trata da aplicação de penalidades administrativas
Ludwig Lopes (*)
Às vésperas da entrada em vigor dos artigos 52, 53 e 54 da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), os quais tratam das sanções administrativas impostas aos agentes – assim entendidos como sendo as pessoas naturais e jurídicas que realizem o tratamento de dados pessoais – que descumprirem as obrigações na referida lei de dados, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) submeteu à consulta pública a minuta da resolução que disporá sobre a fiscalização e a aplicação de sanção pela Autoridade.
Com base no texto apresentado, pode-se desde já analisar e projetar como será a atuação da ANPD, em especial a partir de 1º de agosto, quando os dispositivos relativos a punições administrativas passaram a vigorar. A minuta submetida à consulta pública trata desde questões relativas a definições, contagem de prazos administrativos, passando pelas atividades de fiscalização, monitoramento, orientação e prevenção, avançando até o processo destinado a aplicação de sanções administrativas e suas fases.
Neste contexto, verifica-se que as atividades de monitoramento servirão de bússola à atuação fiscalizatória e, consequentemente, punitiva da Autoridade de Proteção de Dados, conforme expressamente indicado no Art. 17 e respectivos incisos, do texto já disponibilizado.
Além disso, o Inciso III do mesmo dispositivo prevê que a atividade de monitoramento também terá o escopo de “diferenciar o risco regulatório em função do comportamento dos agentes de tratamento, de modo a alocar recursos e adotar ações compatíveis com o risco”.
A diferenciação do risco envolvido constará tanto do relatório de análise de ciclo de monitoramento quando do mapa de temas prioritários a serem confeccionados pela ANPD. Enquanto o relatório de análise de risco consolidará as informações, reclamações e denúncias recebidas, o mapa de temas prioritários reunirá os temas considerados mais relevantes e urgentes, tomando por base os riscos, a gravidade, a atualidade e a relevância da matéria, para fins de estudo e fiscalização.
A minuta de resolução indica que o mapa de temas prioritários será bianual e, por certo, será influenciado pelos relatórios de análise de ciclo de monitoramento que tiverem sido produzidos no período anterior, de modo a se traçar uma estratégia de atuação e fiscalização por parte da ANPD.
Além disso, o Artigo 22 da minuta proposta prevê que do mapa de temas relevantes constará “a memória do processo decisório do qual decorreu a seleção e priorização dos temas, inclusive as metodologias de priorização empregadas”, bem como os objetivos e metas a serem alcançados, cronograma de execução e eventual necessidade de interação com outros órgãos e entes de administração pública.
Com relação ao relatório de monitoramento, este será elaborado em ciclos – cuja periodicidade não foi objeto da resolução –, considerando o volume e conclusões das reclamações e denúncias recebidas, além de informações recebidas de outras fontes.
Dentre estas fontes auxiliares de informações, embora não explicitadas, podemos supor que sejam o resultado de apurações e levantamentos realizados junto a Procons, Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, dentre outros órgãos e entes públicos nacionais e autoridades de proteção de dados de outros países ou de natureza internacional.
Classificação dos agentes
Encerrado o ciclo de tratamento, a Coordenação Geral de Fiscalização classificará os agentes de tratamento identificados nas reclamações e denúncias recebidas, bem como os identificados em levantamentos encaminhados por outras fontes à ANPD, para fins de verificação de necessidade ou não de adoção de medidas imediatas, conforme se verifica dos Artigos 29 e 30 da minuta de resolução em estudo.
A classificação será feita em quatro faixas, sendo a faixa I a destinada aos agentes que não serão – por conta de sua classificação – alvo de medidas por parte da ANPD, avançando progressivamente até a faixa IV, cujos agentes de tratamento de dados serão alvo de medidas preventivas ou repressivas por parte da entidade. Destaca-se que a ANPD aplicará medidas repressivas aos agentes que por dois ciclos consecutivos se mantiveram da faixa IV de classificação do ciclo de monitoramento.
A inclusão do agente de tratamento de dados na faixa I, como era de se esperar, não servirá de salvo-conduto contra eventuais fiscalizações ou abertura de processo sancionatório, o qual não se origina apenas do relatório de análise de ciclo de monitoramento. Os processos fiscalizatórios podem se originar tanto de denúncias quanto de reclamações graves, bem como do programa de fiscalização da ANPD – pautado pelo mapa de temas prioritários – e até em decorrência de ações conjuntas com órgãos, entes públicos.
A despeito dessa atuação, em qualquer hipótese, a aplicação de medida repressiva deverá observar as regras do processo administrativo sancionador previstas na própria minuta de resolução (Artigos 42 e seguintes), bem como observando-se a Lei n.º 9.784/1999, que trata dos processos administrativos em âmbito federal.
O texto preliminar da resolução sobre fiscalização e aplicação de sanções administrativas por parte da ANPD mostra-se bastante razoável, de modo que se pode esperar que, ao menos neste primeiro momento, sua atuação se mostre mais presente em temas de relevância ampla e que sua fiscalização seja mais atuante nos agentes que concentrem o maior número ou mais graves denúncias por descumprimento da LGPD.
(*) Coordenador da área Cível e Empresarial no FNCA Advogados. LLM e especialista em Direito Empresarial