Mundo do Direito passa por mudanças culturais e de mindset, inovando os modelos de negócios

Ralff Tozatti, diretor de Marketing da Thomson Reuters para a América Latina

A transformação digital das atividades jurídicas, com a centralidade assumida pela customer experience, possibilita a criação de novas propostas de valor por parte dos advogados

Irineu Uehara

Ao acelerar o passo na caminhada rumo à transformação digital, o mundo jurídico no Brasil já ensaia uma grande virada de mindset e de cultura, introduzindo práticas disruptivas no planejamento e na condução dos negócios.

Novos conceitos e metodologias apontam concretamente para o papel central dos relacionamentos humanos. “Antes falávamos de business-to-consumer e business-to-business. Mas agora o foco vai ser no human-to-human”, salienta Ralff Tozatti, diretor de Marketing da Thomson Reuters para a América Latina, em entrevista concedida a Law Innovation.

“Qualquer metodologia que ajude a melhorar os relacionamentos, seja no aspecto racional, seja no emocional, pode ser aplicada, não importa se a matéria é o Direito, a Contabilidade, o Marketing ou as Finanças. Trata-se no fim das contas de lidar com relações humanas, o que afeta o poder de influenciar as pessoas”, completa ele.

A partir desta compreensão de todos os pontos de contato, os advogados tornam-se aptos a gerar propostas de valor adequadas, concretizá-las na forma de produtos e serviços e monetizá-las, em benefício de suas organizações.

É assim que conceitos avançados como “customer experience”, “customer centricity” e “customer journey” vão adquirindo proeminência no planejamento estratégico da área jurídica, replicando, aliás, o que já se vinha registrando em outras verticais da economia. “A questão é como fazer essas mudanças em maior escala e mais rapidamente”, assinala o entrevistado.

Este reposicionamento torna-se imprescindível se forem considerados os desafios impostos hoje pelo cenário da competição no ramo do Direito. A juízo de Tozatti, ocorre atualmente uma standardização da oferta, pela qual vão deixando de existir diferenças significativas entre os produtos de diversos concorrentes.

É deste modo que ganha terreno o processo de “unbranding”, em que as marcas comerciais tendem a perder relevância no mercado, fato que, na opinião do diretor, incide mais fortemente sobre a base da pirâmide, onde a disputa se dá por custo e não por uma diferenciação competitiva de valor do “brand”.

Em contraste, firmas advocatícias que se postam no topo da pirâmide usualmente atuam em nichos específicos, onde o peso das marcas renomadas segue sendo determinante, sofrendo por isso um menor nível de desgaste.

Transformação digital acirra concorrência

A digitalização vem acirrar a disputa por clientes ao abrir espaço para novos entrantes no mercado. “A acessibilidade digital”, avalia o especialista da Thomson Reuters, “traz uma competição muito mais aguerrida pelo preço do que por outros fatores, embora também acabe pesando a qualidade dos serviços prestados.”

Em meio a estas movimentações no panorama competitivo, as startups jurídicas devem desfrutar de múltiplas e crescentes oportunidades de atuação. Ralff Tozatti, por sinal, acredita que as legaltechs e lawtechs poderão assumir, no segmento jurídico, a mesma importância que as fintechs estão tendo na indústria financeira, ao concorrerem diretamente com os bancos tradicionais ou tornando-se parceiros deles.

“Por sermos um mercado exponencial, a probabilidade de termos um ecossistema tão grande como o das fintechs é enorme, e isso pode acontecer a curto prazo”, prevê Tozatti. Ele lembra, porém, que a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) exerce um papel regulador do setor e que muitas das mudanças dependem do seu aval.

Para ilustrar o potencial trazido pelas inovações no Direito, o entrevistado cita o ecossistema de mediação, que veio para simplificar os processos jurídicos. Outra janela de oportunidade está nas soluções de RPA (Automação Robótica de Processos), imprescindíveis para dar conta da montanha de processos pendentes na Justiça, que batem em 100 milhões, para uma população de pouco mais de 200 milhões de brasileiros. “O volume é estrondoso e muitas startups vão nascer aproveitando este nicho de mercado”, conclui.

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