O Compliance não pode ser negligenciado durante a pandemia. É um aliado das empresas para mitigar riscos, garantir a transparência, proteger o caixa e assegurar a perenidade dos negócios.
Jefferson Kiyohara (*)
O atual cenário de pandemia fez com que muitas organizações corressem para ativar ou elaborar um plano de gestão de crises. A continuidade dos negócios ganhou prioridade, assim como colocar em home office a equipe desde que o trabalho permitisse este modelo de atuação. Ações sociais e doações também ganharam força, assim como novos fornecedores foram buscados para garantir a continuidade das operações.
Nesta toada, o Compliance em muitas empresas deixou de ser prioridade, pois não conversa com o contexto atual, certo? Infelizmente esta é a visão de muitos executivos e donos de empresa, mas, eliminando esta área, como tratar devidamente a gestão de riscos dos negócios?
Muitas empresas adotaram novas rotinas e processos, mas que não estão formalizados nas políticas corporativas. As políticas não foram atualizadas para refletir a nova realidade de trabalho remoto e o uso intensivo de ferramentas de conferência e afins. Tampouco os colaboradores foram treinados adequadamente, cenário que dificulta um trabalho alinhado às expectativas da empresa e, futuramente, interfere na aplicação de sanções àqueles que não seguirem as orientações corporativas.
Aqui, o Compliance pode ser um aliado a partir da sua experiência em elaboração de normativos e ações de comunicação e treinamento. E vamos além… e as doações, tão necessárias neste momento de pandemia? Estas também podem se tornar um problema. Sem os devidos controles e precauções, podem gerar desembolsos imprevistos, além de serem um caminho para desvios e fraudes, ou mesmo para o pagamento de propina.
A corrupção continua sendo crime e a boa intenção não é suficiente para justificar a falta dos devidos cuidados ou desconhecimento dos executivos. Um erro comum é não realizar a correta diligência reputacional da organização que irá receber a doação.
Não basta ser um nome conhecido, é preciso avaliar se há histórico de corrupção e improbidade, de má gestão ou desvio de recursos, se há envolvimento de pessoas politicamente expostas ou conexões com políticos e partidos, por exemplo. Um processo mal conduzido pode trazer sérias consequências para a empresa e seus executivos. Lembre-se: a postura “doei e fiz a minha parte” é insuficiente e inadequada.
Neste caso, é fundamental seguir todos os trâmites e ritos legais necessários, ter uma política de doações formalizada e segui-la, formalizar o processo em contrato, declaração ou termo, realizar a prévia due diligence e mitigar os riscos advindos de potenciais conflito de interesses.
Transparência e visibilidade
Outra etapa fundamental é ser transparente e dar visibilidade às ações. Auditar e acompanhar a utilização da doação feita também é muito importante. Vale pedir fotos, vídeos ou mesmo realizar uma auditoria independente.
Da mesma forma, a gestão de terceiros merece atenção, tais como parceiros de negócio, intermediários e fornecedores. Seja no âmbito público, como privado, há um cenário diferente em razão da pandemia, o que tem exigido maior flexibilidade e busca rápida por opções. É neste relaxamento que as fraudes e os pagamento de suborno acontecem, muitas vezes associados a superfaturamento.
A pressão leva à miopia corporativa. E, neste caso, a área de Compliance pode ajudar na proteção da empresa com ações como a elaboração e divulgação do código de conduta de terceiros e da política de gestão de riscos de terceiros, além de treinamento e realização de due diligence reputacional, entre outros processos. É importante conhecer com quem você trabalha, assim como é preciso considerar o monitoramento dos contratos e a auditoria pré e pós dos terceiros.
O Compliance existe para ser um aliado ao negócio, e não pode ser relegado a um segundo plano. É uma engrenagem fundamental para a proteção do caixa e para a perenidade dos negócios. Novos processos, doações e contratações trazem riscos que o Compliance ajuda a mitigar, sem contar a garantia de transparência e integridade nas relações entre as organizações. Este é o momento para fortalecê-lo e de incentivar que todas as organizações desenvolvam um programa de integridade efetivo, coibindo assim a atuação de fraudadores e corruptos.
(*) Diretor de Compliance na ICTS Protiviti, empresa especializada em soluções para gestão de riscos, Compliance, auditoria interna, investigação, proteção e privacidade de dados.