A contratação de influenciador sem o envolvimento do Departamento de Compliance, ou seja, sem que seja realizado um processo de avaliação reputacional, pode acabar expondo as empresas a um enorme risco à sua imagem
Patricia Punder (*)
Segundo a pesquisa da empresa Nielsen, o Brasil é o campeão mundial em número de influenciadores digitais na plataforma Instagram: são 10,5 milhões, com pelo menos mil seguidores cada. O investimento das empresas no “marketing de influência” tem crescido exponencialmente nos últimos anos, principalmente com o advento da pandemia da Covid-19, que levou milhões de brasileiros a usarem cada vez mais a tecnologia para se comunicarem, assim como para se distraírem ou se divertirem.
Em primeiro lugar, podemos afirmar que o “marketing de influência” não é uma atividade ilegal, mas pode ser antiética. A ética da “mercadização” são os princípios e valores morais que precisam ser seguidos durante qualquer tipo de comunicação e ação de marketing.
Quando uma empresa, através de ações de marketing, resolve criar valor e chamar atenção dos clientes para comercializar produtos e serviços, a finalidade deve ser a geração de um relacionamento de confiança e transparência entre a empresa e os consumidores.
Tradicionalmente, essas comercializações ocorriam nas televisões e revistas, mas, com o avanço tecnológico mencionado, agora temos algoritmos que selecionam, de forma mais efetiva, qual público-alvo terá maior engajamento e, consequentemente, irá adquirir os produtos e/ou serviços oferecidos.
Quando falamos em influenciadores digitais, estamos diante de seres humanos, ou profissionais, que são criadores de conteúdo, que possuem alta capacidade de influenciar o comportamento e a opinião de seu público, e são referências em seus determinados segmentos.
Como estamos diante de seres que representam marcas, as empresas devem, de forma preventiva, avaliar quais são os valores morais que estes influenciadores possuem. Ademais, entender a vida pregressa deles também é essencial. Afinal, nenhuma empresa quer sua marca vinculada com alguém que já foi processado por racismo, violência doméstica ou tráfico de drogas.
Uma contratação de influenciador digital sem o envolvimento do Departamento de Compliance, ou seja, sem que seja realizado um processo de avaliação reputacional, pode acabar expondo as empresas a um enorme risco à sua imagem e reputação.
O objetivo das empresas deveria ser buscar influenciadores digitais que tenham os mesmos valores preconizados pela companhia contratante. Esta sinergia de valores gera maior credibilidade na forma como estes profissionais influenciam seus seguidores.
No entanto, como são os departamentos de marketing e agências de publicidade que gerenciam o processo de contratação dos influenciadores digitais sem o cuidado em compreender os seus valores e a sua reputação, podemos assistir a situações de marcas importantes terem sua reputação manchada e até abalada devido ao comportamento antiético e/ou ilegal de influencers.
Estudo da CVM
O assunto é tão relevante que, em 2022, a própria Comissão de Valores Mobiliários (CVM) publicou um estudo sobre influenciadores digitais e o mercado de capitais, que busca investigar a possível regulamentação da relação comercial entre tais influencers e participantes do mercado de valores mobiliários regulados pela CVM.
O objetivo da Comissão não é regular a atuação dos influenciadores, mas estender a eles as obrigações exigidas aos regulados da CVM. É preciso ficar claro que o profissional está sendo remunerado para dar aquela opinião. O objetivo é informar o público investidor de que aquela orientação, informação ou opinião, está sendo emitida por conta de um contrato entre o influenciador e um regulado da CVM. Transparência para o investidor faz parte da boa conduta no mercado de capitais e deve ser zelada e praticada por todos que atuam nele.
Sendo assim, existindo um contrato mediante remuneração, o porta-voz tem a responsabilidade de influenciar o comportamento e a opinião de seu público dentro de preceitos éticos e legais.
(*) Advogada e CEO da Punder Advogados, professora de Compliance no pós-MBA da USFSCAR e da Legal Ethics and Compliance (LEC – SP)