É essencial hoje investir em tecnologia e soluções digitais que otimizem os processos de conformidade, como gestão dos riscos, políticas, treinamentos, canal de denúncias, relacionamento e avaliação de fornecedores
Emerson Melo e Raphael Soré *
O mundo continua sofrendo com os efeitos colaterais da pandemia, há mais de um ano agravados pela invasão da Rússia à Ucrânia, que, além da tragédia humana, elevou o preço de matérias-primas, distribuição e logística. Nesse período, observamos a capacidade da sociedade e dos negócios de se solidarizar, organizarem e se adaptarem aos ambientes de incerteza. Uma das mudanças mais significativas refere-se à forma como trabalhamos. O modelo anterior tornou-se obsoleto e não será retomado.
No Brasil, o cenário é permeado pela insegurança jurídica, baixo crescimento do PIB, pressão fiscal e as expectativas naturais relativas a um novo governo. Assim, caberá às empresas, ao universo corporativo e a todas as organizações adaptarem-se à conjuntura. No primeiro trimestre deste ano, é hora de planejar como serão os próximos meses e adotar as medidas adequadas, com base nas lições aprendidas, corrigindo eventuais erros do passado. Visando ao enfrentamento exitoso dos desafios presentes, há algumas estratégias que podem ajudar bastante.
O estudo KPMG CEO Outlook 2022 apontou que 88% desses executivos brasileiros têm uma atitude agressiva de investimento digital e 82%, um plano para lidar com ataques de ramsoware. Diante da necessidade de fazer negócios e entendendo que o mundo está cada vez mais digital, é importante que novas soluções sejam aplicadas também às linhas de defesa da governança corporativa. Por isso, investir em tecnologia e soluções digitais que otimizem os processos de compliance, como gestão dos riscos, políticas, treinamentos, canal de denúncias, relacionamento e avaliação de fornecedores, será essencial para que os profissionais possam dedicar-se ao que realmente importa. Ademais, contar com mecanismos que contribuam para a análise desses dados proporcionará significativos ganhos na definição de estratégias preventivas.
O mesmo estudo apontou como principais estratégias o monitoramento profundo da cadeia produtiva e a diversificação dos fornecedores, conforme 26% e 32% dos entrevistados, respectivamente. Adicionalmente, há uma tendência mundial, que reverberará nos próximos anos, quanto ao avanço das leis para que as organizações lidem de maneira mais rigorosa com seus terceiros e a cadeia produtiva. Ter um forte programa de conformidade da porta para dentro já não será mais suficiente. Conhecer os terceiros, monitorá-los e, em muitos casos, desenvolvê-los será a chave para o mundo dos negócios.
Exemplo desse movimento de transformação legislativa é a Lei Alemã de Due Diligence da Cadeia de Suprimentos. Em vigor desde 1º de janeiro de 2023, estabelece que todas as empresas com sede principal no país cumpram os direitos humanos fundamentais e certas disposições ambientais em suas cadeias de suprimentos. A Suíça, a Holanda e a União Europeia também têm minutas desse tipo de regulamentação em andamento. Pode-se inferir que não tardará até que exigências análogas sejam adotadas globalmente.
No contexto dos cenários apontados pelo estudo da KPMG, executivos e profissionais de compliance devem olhar com muita atenção para os anseios e expectativas dos clientes, em todos os mercados. Diminui o número de pessoas dispostas a expor seu trabalho ou sua vida a práticas consideradas inadequadas. O consumidor passou a observar se as organizações respeitam os direitos humanos dos seus funcionários ou se seus processos produtivos são sustentáveis, com redução do uso de recursos naturais e minimização dos impactos ambientais.
Divulgar os resultados de ESG alinhados à ética e à integridade prevenirá casos de greenwashing, que não têm mais espaço no mercado e podem ser considerados um “tiro no pé” para empresas que exageram ou mentem sobre suas conquistas. Ao compliance compete criar mecanismos para impedir a comunicação ilegítima. Também é preciso reavaliar os riscos e atualizar os processos e controles, visando reforçar as políticas para garantir a sustentabilidade dos negócios.
* Emerson Melo é sócio-líder da Prática de Forense da KPMG no Brasil e colíder na América do Sul e Raphael Soré é sócio da Prática de Forense da KPMG no Brasil