Você realmente está preparado para o trabalho híbrido? O que os RHs precisam saber

O conceito para obter bons resultados no formato híbrido é o remote first, modelo no qual o trabalho remoto é priorizado, mesmo quando as pessoas estão no escritório. Parece simples, mas, na prática traz muitos desafios culturais nos quais o papel da liderança torna-se mais uma vez extremamente importante

Sarah Hirota*

Ainda que seja cedo para apontar como será o ambiente de trabalho pós-pandemia, a única certeza que temos, no momento, é que o ambiente 100% em escritório não é mais essencial. O que vem sendo discutido entre a maior parte das empresas é qual formato será adotado agora. Muitos profissionais ao redor do mundo estão pedindo demissão pela iminente ameaça de terem que trabalhar de forma presencial, o que vem deixando muitas empresas preocupadas e desnorteadas. 

Uma pesquisa com 1.000 americanos mostrou que 39% estavam dispostos a deixar seus cargos caso seus empregadores não fossem flexíveis quanto a trabalhar remotamente. Apenas cerca de 30% dos trabalhadores nos EUA retornaram aos escritórios. Sem dúvidas, o modelo mais desafiador é o híbrido, pois coloca os colaboradores em condições distintas (há um misto de pessoas dentro e fora dos escritórios e não 100% das pessoas em uma mesma condição) precisando tornar igual a experiência tanto para quem está no escritório da empresa, quanto para quem está fora dela, seja em casa ou em outro local.

O último relatório da Accenture mostrou que 83% das pessoas dizem que o modelo de trabalho híbrido (alternando entre home e escritório) seria o ideal, mostrando que indivíduos têm a capacidade de trabalhar remotamente entre 25% e 75% do tempo. Mesmo enxergando os benefícios do modelo remoto, ainda existe a ideia de que fora do ambiente de trabalho comum a pessoa esteja perdendo oportunidades por não participar daqueles encontros e discussões informais; os “cafezinhos”, que podem contribuir nas decisões do dia a dia que afetam o desenvolvimento ou sua performance. 

O conceito para obter bons resultados no formato híbrido é o remote first, ou um modelo em que o trabalho remoto é priorizado, mesmo quando as pessoas estão no escritório. Parece simples, mas, na prática traz muitos desafios culturais nos quais o papel da liderança torna-se mais uma vez extremamente importante. Estávamos acostumados a trabalhar em sincronia, ou seja, com colaboração, interações e acompanhamento simultâneo. 

No remote first os líderes passam a ter que considerar muito mais o modelo assíncrono, aquele que acontece sem a necessidade de uma interação em tempo real. Para isso, torna-se essencial o olhar para o indivíduo, os pequenos grupos de perfis e a missão do time (atividades e entregas) ao definir as regras de convivência da equipe. A seguir, apresento alguns pontos que precisam ser avaliados e bem definidos junto às equipes para que cada um se sinta mais seguro de seus papéis e responsabilidades, tornando mais fluido o trabalho: 

  1. Flexibilidade geográfica: quais atividades são mais bem desempenhadas de forma conjunta e presencial e quais têm seu melhor resultado obtido com as pessoas mais focadas? Em processos de inovação e co-criação é importante o contato pessoal, enquanto atividades mais analíticas requerem foco e atenção. 

Quais as preferências de cada indivíduo? Quais as restrições que cada indivíduo possui em cada localidade? Por exemplo, alguns moram longe do escritório e por isso gastariam muito tempo em trajeto, outros moram com mais pessoas e não conseguem trabalhar focados em sua residência ou até precisam conciliar com outras atividades pessoais como levar os filhos para escola, mas possuem algum escritório compartilhado próximo de onde podem trabalhar. 

  1. Flexibilidade de tempo:quais atividades precisam ser realizadas de forma síncrona? Feedbacks e algumas comunicações precisam ocorrer de forma quase que imediata para o time ao mesmo tempo e, por outro lado, algumas discussões e colaborações podem facilmente ser transferidas a fóruns ou outras ferramentas de comunicação assíncronas. Quais processos precisam ser revisados e podem passar a trabalhar de forma assíncrona, com as pessoas participando nos momentos mais convenientes para elas?

Qual a distribuição de horário do time? Quem prefere iniciar sua jornada mais cedo ou quem prefere estender a jornada? Quem precisa de mais pausas curtas ou quem realiza menos pausas, mas com maior duração? Quais horários temos mais pessoas do time com disponibilidade para uma reunião, seja presencial ou online?  

  1. Direcionadores de produtividade de cada atividade: avaliar se as atividades são direcionadas por energia, foco, coordenação ou cooperação. Atividades que requerem energia e foco tendem a ser melhor desempenhadas de forma remota, pois é possível escolher locais em que o indivíduo consiga balancear tempo de concentração com um tempo intervalo para repor sua energia (uma caminhada, uma atividade externa ou uma série de exercícios físicos simples, como uma ginástica laboral). Atividades que requerem coordenação ou cooperação, são beneficiadas pelo ambiente de trabalho compartilhado, pois uma comunicação direta e proximidade contribuem para melhores resultados.
  2. Processos e fluxos de atividades: quais ferramentas eu disponibilizo para o time para que tanto quem está no escritório quanto para quem está fora dele possam realizar adequadamente suas entregas e atividades do dia a dia? Como eu avalio os processos e resultados? Há redundância de atividades? Posso eliminar atividades? Há novas tarefas? Alguns exemplos: há reuniões que podem ser substituídas por troca de mensagens e colaboração assíncrona? Qual a ferramenta e forma de comunicação assíncrona? Algumas apresentações ou assinatura de documentos, antes presenciais, podem ser substituídas por outras ferramentas digitais? Neste quesito, a digitalização é muito bem vinda, observando-se atentamente às boas práticas em cada tipo de processo.
  3. Senso de inclusão:estou propiciando um ambiente em que realmente o trabalho remoto é incentivado e tratado de forma igual entre pessoas no escritório e fora dele? Torna-se importante o papel do líder. A adoção do formato híbrido não deve ser distinta entre os diferentes cargos da empresa. Os gestores devem ser incentivados a ficarem mais remotos, de forma a dar exemplo prático da eficácia do formato, bem como não incentivar uma ideia de que deve estar vendo seus liderados para melhor avaliá-los. As reuniões são pensadas respeitando restrições de horário ou agenda de cada colaborador? As principais decisões são tomadas em fóruns onde todos os colaboradores podem participar? O líder está disponível e acessível de forma igualitária entre seus liderados? As pessoas de forma geral estão acessíveis?  A avaliação das pessoas é baseada em entregas e resultados? 

Outras políticas também devem ser avaliadas: quais benefícios são concedidos para incentivar o trabalho remoto? Há flexibilidade nos benefícios?

 

Como toda mudança cultural, a adoção de um modelo de trabalho híbrido requer muito estudo, trabalho árduo e um olhar sobre o indivíduo. É uma mudança que deve estar focada nas pessoas. A participação de todos, principalmente das lideranças, é de extrema importância para o sucesso deste processo. As mudanças propostas realmente reforçam os valores e cultura da empresa? Essas mudanças farão seus colaboradores sentirem-se engajados, inspirados e com senso de justiça e propósito? Pense sempre nestas questões ao realizar transformações como essas na organização. 

* líder de Pessoas e Cultura da Fhinck, startup de alta tecnologia que ajuda grandes empresas a terem maior desempenho operacional, eficiência, produtividade e qualidade de vida.

 

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