Normalmente os paraísos fiscais objetivam a evasão fiscal e a proteção patrimonial de seus sócios e acionistas e, em casos mais graves, a lavagem de dinheiro ilícito
Guilherme Cortez (*)
O termo “offshore” tem ganhado grande notoriedade nos últimos anos, especialmente após o famoso escândalo do “Panama Papers”, uma série de documentos confidenciais da sociedade de advogados panamenha “Mossack Fonseca” que foram vazados em 2016 e que revelaram milhares de empresas abertas em “paraísos fiscais”. Normalmente objetivando a evasão fiscal e a proteção patrimonial de seus sócios e acionistas e, em casos mais graves, a lavagem de dinheiro ilícito. Esse último objetivo fez o caso ganhar notoriedade no Brasil: a grande “estrela” da Operação Lava Jato, a Odebrecht, também teve seu nome mencionado nos documentos vazados.
Com polêmicas dessa envergadura, as pessoas passaram a se questionar: afinal, o que é uma “offshore”?
Em tradução livre, o termo significa “afastado/fora da costa”, fazendo menção ao fato de que tais empresas (e contas bancárias) são constituídas em países distintos do domicílio do controlador, na maior parte das vezes em territórios ultramarinos. Embora possa parecer custoso constituir uma empresa em outro país, a legislação local possui diversos benefícios que tornam a ideia atraente.
Para entender a razão de constituir uma “offshore”, é necessário primeiro entender o que é um “paraíso fiscal”. Os países que recebem esta qualificação normalmente possuem legislação fiscal que facilita a entrada de capital estrangeiro, com tributação reduzida em relação aos demais países, tornando a ideia de utilizar o local para “guardar dinheiro” extremamente atrativa.
Embora em primeira avaliação possa parecer questionável, do ponto de vista ético, a forma como tais países construíram sua legislação tributária para criar esse atrativo, é necessário fazer a seguinte análise: normalmente esses países são extensões territoriais insulares, vinculadas a outros países. Por suas condições geográficas, há pouco potencial produtivo na “economia real” desses países, fazendo com que ao longo das décadas eles se especializassem nas “brechas” que o capitalismo financeiro criou.
Legislação societária
Além das vantagens fiscais, há outro benefício que normalmente esses países fornecem aos “investidores”: a legislação societária. Dentre os diversos institutos, um de grande notoriedade são as “ações ao portador”, que costumam integrar o diploma societário dos “paraísos fiscais”.
Enquanto a maior parte dos países só possuem ações nominativas ou escriturais, que mantêm o registro de quem é o proprietário daquelas parcelas da empresa, os paraísos oferecem a possibilidade de a ação ser um título ao portador, ou seja: quem estiver em posse do documento é o proprietário, o que facilita muito a movimentação financeira através da negociação desses papéis. Uma empresa constituída apenas por ações ao portador pode ser transferida pela mera tradição dos papéis, assim como todo o patrimônio vinculado a ela.
Devido a todas as características mencionadas, as “offshores” costumam representar um grande obstáculo aos credores, seja ele o Fisco ou uma empresa comum. Contudo, a fim de evitar novos escândalos de nível global, como o “Panama Papers”, cada vez mais os “paraísos fiscais” vêm firmando tratados de maior transparência no fornecimento de informações de natureza fiscal, a fim de evitar que seu território seja utilizado para evasão fiscal, blindagem patrimonial e, principalmente, lavagem de dinheiro.
(*) Coordenador de investigações da Leme Forense e responsável pelo setor de Análise de Direitos Creditórios